17 dezembro 2006

Faça alguém feliz

Faça alguém feliz, não é difícil.
Saia de carro e deixe alguma porta mal fechada. Pode ser a sua, a do motorista.
Você notará pelo retrovisor que algum outro automóvel está te seguindo e pisca desesperadamente os faróis; o motorista gesticula através do vidro, mas você continua dirigindo calmamente e nota que o motorista agora está tentando chegar perto, emparelhar o carro dele com o seu.
Para fazer isso ele quase subiu na calçada, atravessou o sinal amarelo no último segundo, fechou um ou dois carros que estavam impedindo que ele se aproximasse e, finalmente, consegue parar a seu lado. Ele chama sua atenção com buzinadas curtas, ele não está reclamando com a buzina, ele só quer sua atenção.
Quando finalmente você olha ele está gesticulando frenéticamente, apontando o dedo em sua direção e tentando dizer algo através dos vidros fechados. A boca dele se move lenta e expressivamente, ele quer que você leia seus lábios enquanto inventa sinais com as mãos; ele está passando uma mensagem e sabe que tem que aproveitar aquela chance porque logo logo você e ele serão separados pelo trânsito.
Às vezes ele chega a se debruçar sobre o banco da frente e abre a própria janela para dizer, aflito: A PORTA ESTÁ ABERTA! E só depois de se certificar que você entendeu o recado é que ele relaxa, sorri e vai embora, feliz pelo resto do dia porque ajudou um idiota qualquer (você) que não sabe do enorme perigo que é dirigir com uma porta mal fechada.
Agora, se é você quem quer se sentir feliz e não encontra um idiota com a porta aberta no trânsito, vá para casa e quebre algum copo ou garrafa de vidro. Junte os cacos cuidadosamente e procure aqueles jornais velhos, papelões, o que for que lhe permita fazer aquele embrulho especial que a gente faz para O LIXEIRO NÃO CORTAR A MÃO. Quando a gente consegue fazer um embrulho desses que garanta que O LIXEIRO NÃO VAI CORTAR A MÃO, estamos felizes pelo resto do dia, não tem erro.

3 comentários:

  1. Del, já havia pensado nisso. Que coisa esquisita é essa. Os mesmos caras que atropelam, correm, matam, ficam desesperados quando vêem uma porta de carro aberta. Assim mesmo, do jeito que vc descreveu. O que explica esse fenômeno será o poder que têm sobre vc, motorista incauto, o poder de avisarem algo que vc não sabe e salvá-lo da morte e pensar que praticaram uma ótima ação??
    Sei lá, é muito louco o ser humano. Imagina, todos os dias se deparam com a miséria humana e nem ligam!!
    Outra coisa é o lance de embrulhar vidro em jornal. Será que isso ficou atavicamente registrado em nossa memória? Por que as mais diversas pessoas que não se importam nem um pouco com os outros preocupam-se com o lixeiro?? Não é estranho??
    Engraçado, tinha pensado em escrever sobre isso muitas vezes. mas vc chegou primeiro e com propriedade.
    Beijos. Dri

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  2. Dri, é isso mesmo. Essa idéia me foi passada pelo Dedé (mas eu não sei se foi o Seco, o Mongol ou o Sem D), que foi quem levantou a lebre. Eu transcrevi para o blog porque a observação é ótima. Bjs.

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  3. CÉUS!!
    O TEXTO é ótimo!!

    (e quando gosto assim muuuito nem sei o que dizer, mas eu cortei meu próprio pé no ano-novo por não ter pensado no lixeiro. isso é ser humano; culpa e dor.)

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